sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

THE SIXTH SENSE (1999)


Tenho de começar o texto por avisar que tem SPOILERS, desta vez porque é realmente falar deste filme sem falar da história. Mas sejamos sinceros, tenho a certeza que os 3 indivíduos que acompanham o blog conhecem e viram este filme. 
Há aí um filme a estrear que se chama Split e parece que o filme é mesmo bom. O que nos dias de hoje, dizer isto de um filme do Shyamalan é coisa rara. No ano passado, o realizador já tinha dado sinais que ainda estava vivo com o filme muito simpático The Visit. Como fiquei mesmo interessado neste novo, decidi meter mãos à obra e rever a filmografia (pelo menos a que tinha lá por casa) do gajo. Porque Shyamalan já foi consensualmente um gajo com talento. Rei dos twists, apelidado de "next Spielberg". Uma espécie de Hitchcock dos tempos modernos.

Por isso, vamos lá ver. Em 1999, a internet era coisa que ainda estava um pouco atrasada (pelo menos para mim). A informação que tinha dos filmes vinha toda da revista Premiere (francesa e portuguesa). Mas acabava por ser informação limitada. E ainda bem. Hoje em dia, temos de lutar estoicamente para não ter informação a mais que nos possa tirar o prazer de ver um filme. Eu bem sei a luta que foi em 2015 conseguir ir ver o Star Wars sem nenhuma informação sobre a história do filme. E sei bem que não está a ser fácil aguentar até ir ver este Split.
Em 1999, essa tarefa era mais fácil. Por isso, chegar ao fim do Sexto Sentido e ficar com a típica expressão "WTF" era normal. Porque aquilo foi realmente inovador. E não digo que o Shyamalan tenha inventado a roda. O chamado twist sempre existiu no cinema, mas as pessoas não estavam preparadas para um twist assim. Ainda para mais pela forma como foi contado. 


Volto a avisar: SPOILERS

Mas o que é que trata este filme? Temos o Bruce Willis que é um psicólogo infantil que leva um balázio no bucho no início do filme. O filme avança um ano (creio eu), e ele começa a tratar um miúdo com problemas, o Haley J. Osment. O miúdo é introvertido, passa a vida com medo, os colegas fazem dele gato-sapato. Na verdade, o problema dele é que vê pessoas mortas. A frase "I see dead people" já faz parte das enciclopédias do cinema. E esse é o primeiro twist, a primeira grande revelação do filme, que só acontece a meio. Até ao momento da confissão do miúdo ao psicólogo, percebemos que alguma coisa vai mal, mas não propriamente o quê. A partir daí passam-se uma série de situações, e começamos nós (público) a ver os mortos. Até que chegamos ao final e dá-se o grande "twist". Bruce Willis descobre que afinal ele próprio também está morto (desde o início do filme). E nós descobrimos com ele. Ou seja, durante, praticamente, toda a duração, vemos o filme pelos olhos do Bruce. O que temos ali não é, afinal, um twist. Aliás, todas as situações do filme nos dão provas que ele não está vivo. O gajo não contracena com ninguém, a não ser com o puto. Nunca nos é escondido de alguma forma essa situação. Ao contrário, são-nos dadas tantas pistas para essa revelação final, que a mestria do Shyamalan reside aí mesmo. É que só faltava ao Bruce ter um papel na testa a dizer "eu estou morto" desde que levei o tal balázio no bucho. Acontece que o espectador está tão formatado para um padrão que fica ofuscado. E aí, eu levanto-me e aplaudo o Shyamalan pela ousadia de fazer de nós parvos. 
E por causa disto, o filme só ganha com uma segunda, terceira visualização. Depois de sabermos o principal, já vemos o filme com outros olhos. 

Tecnicamente o filme está do melhor. Desde a banda-sonora do James Newton Howard, que nos deixa com um arrepio na nuca o filme todo, até à própria fotografia. E depois pequenos detalhes que só conseguimos reparar depois de ver várias vezes. Por exemplo, o uso do vermelho, cor associada muitas vezes à morte. Só em casos específicos é que o vermelho é utilizado: camisola do puto; a cena do balão vermelho e escadas com tapete vermelho; o vestido de uma mulher numa cena importante; a maçaneta da porta para a cave que o Bruce tenta abrir várias vezes durante o filme. 


Uma palavra para a dupla principal do filme. Os filmes do Shyamalan (este e o Unbreakable) devem ter sido os últimos em que o Bruce Willis esteve bem. Aliás, não me lembro de uma interpretação dele com tanta subtileza como aqui. Já o Haley Joel Osment deve ter aqui uma das melhores interpretações infantis que me lembro. Os putos no cinema têm a tendência para ser muito irritantes. E com este personagem isso era muito fácil de acontecer. Só que o puto tem uma interpretação de alto nível, digna de prémios e Óscares e tal.

Finalmente, digo só uma coisa: este é um verdadeiro filme de terror. Não que tenha monstros, sangue, gore ou jump-scares. Este vai à raiz do medo. Basta-me uma cena para exemplificar isso, e nem envolve directamente os personagens principais. A dada altura, durante um funeral, o pai da defunta assiste a um vídeo de como a filha foi morrendo envenenada pela madrasta. Essa cena provoca tal sentimento que é de horror primário. Um pai que perde a filha, que foi envenenada pela companheira. Querem algo mais terrífico? 

E como o texto já vai longo, concluo apenas dizendo que mais do que um filme sobre um miúdo que vê pessoas mortas, este é um filme sobre fé, arrependimento, mágoa, pesar, mágoa. Um filme que envelhece como o vinho do Porto, e que foi uma entrada pela porta grande ao grande público de Shyamalan

TOP Shyamalan até ao momento:

The Sixth Sense

(Próximo filme: Unbreakable. Um filme de super-heróis sobre super-heróis.)

PS. Antes que me esqueça: ide ver a cena em que o puto revela ao psicólogo que vê mortos. A forma como está filmada. A sério... ide lá que vale tanto a pena. Depois digam-me se não sentiram os vossos pêlos do corpo eriçarem-se.


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